domingo, 6 de abril de 2014

Memória e Verdade inegociáveis

Memória e Verdade inegociáveis.


Uma a uma vão se apagando as lembranças,
como se habitasse a vida o esquecimento,
e da terra evaporasse o sangue,
e do éter os gritos dos nossos mortos.

Porque esse silêncio?
Porquê esse descaso?
Por onde andará minha criança?

Eu quero saber!
Preciso saber para viver,
pois não saber é viver a morte.

Não aceitarei o desatino dessa incerteza,
pelo menos, não calado!
Se o destino é parado,
que espere, estou chegando.

Que se calem as gentes,
o Estado e os quartéis;
que parem as rotativas,
ou que continuem triturando
a verdade e a história,
semeando mentiras.

Que se cale a consciência
dos carrascos,
que continue calada a legião dos omissos;
que se fartem,
com o silenciar dos ais
que habitam os porões;
que esqueçam o balé
de meninos com dragões;
que se satisfaçam
com o silêncio dos canhões!

Mas, não eu! Não calarei!

Não darei aos algozes
o prazer da rendição,
que mais que isso
é conivência,
é silêncio de covarde,
e, como ele,
deve ficar insepulto,
vísceras expostas
sob a luz da verdade!

Não terão  silêncios!
De mim não terão silêncios!
Não tenho silêncios!

Meus silêncios são habitados
por gritos de dor e clamor de vingança.

Não quero justiça!
Nunca teremos justiça.
Quero vingança!

Vingança é a justiça dos que tombam em combate.

O resto é missa e não creio em deus,
nem em padres, pastores ou diabos.

Creio na liberdade
e por ela tombei
e vi tombarem,
por ela matei
e vi torturarem.

Creio no chão em que piso,
na terra que produz,
e na exploração humana.

Creio no que vi, vejo e sinto,
e sinto que não posso parar,
que preciso gritar.

Por cada um que perdeu a voz,
por cada um que perdeu a vida,
por cada ser torturado,
por cada pessoa desaparecida,
e por cada mulher e cada homem,
que ficaram órfãos de seus filhos.

Não calarei e cavalgarei
meu grito de morte,
meu canto de guerra,
e com meu santo guerreiro
buscarei no fundo do mar,
debaixo das pedras,
nos buracos das selvas,
sob o véu da omissão,
nos fornos das fábricas,
debaixo das pontes,
no fundo dos lagos,
nos leitos dos rios,
nas lembranças perdidas,
nos arquivos dos quartéis:
até encontrar o último desaparecido,
dos campos ou das cidades.

Enquanto não for encontrado,
não haverá justiça com o passado.

E muito menos, verdade!



Rio de Janeiro, 6 de abril de 2014.
Por Paulo da Vida Athos



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