sábado, 9 de junho de 2007

VESTAIS EUROPEUS E A TORTURA


VÔOS SECRETOS ATINGEM EUROPEUS












RELATÓRIO ACUSA POLÔNIA E ROMÊNIA DE RECEBEREM PRISIONEIROS EM CENTROS DE TORTURA DA CIA


ESTRASBURGO, França Polônia e Romênia foram acusadas ontem de terem abrigado prisões secretas para onde suspeitos de terrorismo foram levados e torturados por agentes da CIA. No relatório apresentado ao Conselho da Europa, governantes desses países foram acusados de terem aceitado tais centros de detenção secretos.

Reino Unido e Tailândia também sofreram acusações, enquanto Alemanha, Itália e Macedônia foram criticadas por prejudicar a investigação.

As denúncias contra os países foram feitas pelo advogado suíço Dick Marty, membro do Parlamento do Conselho da Europa, entidade que reúne 47 países e cuja função prioritária é a defesa dos direitos humanos no continente europeu. Marty acusou os países de terem se aliado à política criada pelo presidente dos EUA, George W. Bush, após os ataques do 11 de Setembro, de “matar, capturar e deter suspeitos de terrorismo considerados de grande valor”.

— Há provas suficientes para afirmar que centros de detenção secretos gerenciados pela CIA existiram na Europa, entre 2003 e 2005, em particular em Polônia e Romênia — disse Marty, que revelou que só agentes americanos tiveram contato com os presos.

Ele criticou os EUA por ter realizado as ações fora de seu território, pois seriam consideradas contra as leis americanas. Mas se concentrou em denunciar os países europeus, pois eles devem obediência legal à Convenção Européia dos Direitos Humanos.

— Centenas e centenas de pessoas foram seqüestradas, torturadas, ilegalmente detidas, algumas delas ano após ano, e depois libertadas sem qualquer pedido de desculpas, sem qualquer compensação. Eu acho isso indecente, acho isso intolerável numa sociedade livre e democrática — denunciou Marty.

LÍDERES SABERIAM DAS PRISÕES SECRETAS

Em seu relatório, baseado em entrevistas de 30 agentes de inteligência e cruzamentos de dados oficiais, o advogado suíço aponta para a cúpula do governo dos dois países. Segundo ele, o então presidente da Polônia, Aleksander Kwasniewski, foi “a principal autoridade nacional no programa”, tendo conhecimento de cada fase das atividades. Outros assessores próximos do presidente, como o diretor de Segurança Nacional, Marek Siwiec, auxiliaram a CIA em seus vôos secretos e sessões em que eram usadas “técnicas de interrogatório aprimoradas”, que Marty descreveu como “eufemismo para tortura”.

Na Romênia, como houve uma eleição no período investigado, dois presidentes tiveram participação direta no programa. As prisões secretas começaram no governo do presidente Ion Iliescu e continuaram depois da posse, em dezembro de 2004, do atual mandatário romeno, Traian Basescu.

Marty frisa a importância do diretor de inteligência militar, Sergiu Medar, “única autoridade que continuou no cargo nas duas presidências”.

Segundo o relatório, a rede começou a ser montada em outubro de 2001, com um acordo feito através da Otan. A Polônia era o país mais importante no esquema, que teria começado com a transferência de Abu Zubaydah para o país em 2003. Pouco depois, teria sido levado para lá Khalid Sheikh Mohammed, considerado o mentor do 11 de Setembro. Já a Romênia teria sido usada para o interrogatório de suspeitos menos importantes.

Os governos de Polônia e Romênia negaram as acusações ontem. O ex-presidente Kwasniewski negou qualquer envolvimento: — Nego que tenha havido prisões secretas na Polônia e nego ter aprovado tais prisões ou ter tido conhecimento delas.

A Otan também disse que jamais realizou tal tipo de operação.

Marty revelou que a ilha de Diego Garcia, no Oceano Índico e pertencente ao Reino Unido, e a Tailândia foram usadas na rede. O relatório também fez críticas graves a Alemanha, Itália e Macedônia por terem se recusado a colaborar com as investigações.

Berlim e Roma chegaram a decretar segredo de Estado para não fornecerem dados. Mas ele elogiou os governos de Canadá e Bósnia por terem pedido desculpas a suspeitos detidos e depois libertados.

Bush esteve ontem em dois dos países citados pelo relatório. Pela manhã, ele foi recebido pelo presidente da Polônia, Lech Kaczynski, em Gdansk.

Mais tarde chegou à Itália, horas depois do início do julgamento de 26 agentes da CIA responsabilizados pelo seqüestro do clérigo muçulmano Abu Omar, em Milão. Apenas um dos acusados, um italiano, estava presente, enquanto os americanos estão sendo julgados in absentia.

Bush, que nos últimos dias passou por República Tcheca e Alemanha, visitará também Albânia e Bulgária.


Fonte: O Globo, 9 de junho de 2007, pg. 33

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