quinta-feira, 29 de outubro de 2009

A POLÍCIA QUE MAIS MATA NO MUNDO

























Licença para matar...mais.

As mortes em confrontos com a polícia no Estado do Rio de Janeiro no mês de maio subiram 7,3% em relação a maio de 2007, mostra a análise do Instituto de Segurança Pública (ISP) sobre o índice de criminalidade no Estado. No total do ano, foram 649 mortes, um aumento de 10,8% em relação ao total do mesmo período de 2007 (586 mortes). Os números foram contabilizados pelo Núcleo de Pesquisa em Justiça Criminal e Segurança Pública (Nupesp).

Veja também:

Números da violência no Rio

Policiais do Rio usam internet para se defender

Outros crimes que apresentaram aumento em 2008, segundo os números contabilizados pelo Núcleo de Pesquisa em Justiça Criminal e Segurança Pública (Nupesp), foram os homicídios culposos no trânsito - com aumento de 1,2% em relação a maio passado e de 0,6% em relação ao acumulado do ano -, os latrocínios (roubos seguidos de mortes) - aumento de 29,4% no mês e 20,8% no acumulado do ano - e o roubo a transeunte - com aumento de 8,9% no mês e 18,5% no acumulado do ano até maio.

Já crimes como homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte, roubo e furto de veículos e roubo em coletivos e residências apresentaram queda em comparação a 2007, tanto no mês de maio como no acumulado do ano.

Os homicídios dolosos diminuíram 11,8% no mês e 9,3% no acumulado, e as lesões corporais seguidas de morte tiveram 17 casos no acumulado do ano, em relação às 24 mortes de 2007, uma redução de 29,2%.

O ISP declarou que não comenta o impacto dos números, responsabilizando-se apenas pela metodologia de pesquisa e divulgação do resultado. E a Secretaria de Segurança Pública do Estado declarou que nenhum dos responsáveis estava disponível para comentar os resultados nesta sexta-feira, 25.

Polícia que mais mata

Os números vêm para confirmar uma estatística revelada no início do mês de julho: nunca policiais fluminenses mataram tanto quanto neste ano. E se distanciaram ainda mais num ranking negativo: é a polícia que mais mata no mundo, como já mostravam dados de 2003. Um em cada cinco homicídios, como a morte do menino João Roberto, de 3 anos, tem como autor um policial.

Entre os Estados brasileiros e países que registram dados oficiais, os 1.195 autos de resistência - quando o agente alega ter matado em confronto - de 2003 já superavam todos os casos na Europa e na América do Norte.

Em todas as divisões dos Estados Unidos, registraram-se 370 vítimas em ações policiais. Nem mesmo as forças sul-africanas, consideradas as mais violentas do mundo, chegaram perto dos colegas fluminenses no período - 681 vítimas. Só o Estado de São Paulo, com 756 registros, se aproximou. Na comparação com países europeus, havia um abismo. Duas pessoas foram mortas em confronto com a polícia francesa em 2003, mesmo número registrado no Reino Unido. Em Portugal, apenas uma pessoa morreu nesse período. Na América Latina, o líder negativo era a Argentina, mesmo assim com 288 vítimas.

No ano passado, porém, as diferenças entre paulistas e fluminenses se acentuaram. No Estado de São Paulo, houve 377 autos de resistência; no Rio, foram 1.330. Para piorar, o total de mortes em confronto registrados no Estado vizinho avançou 12% entre janeiro e abril deste ano (502 autos de resistência) em relação ao mesmo período do ano passado (449 casos).

Fonte: O Estado de S. Paulo


segunda-feira, 26 de outubro de 2009

PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 33, § 4º e 44 da LEI 11.343/06


Sobre os Limites da Pena



Antes mesmo que, por declaração de inconstitucionalidade no ano 2006 (HC-82.959, Ministro Marco Aurélio), deixasse de compor o nosso ordenamento jurídico o malfeito e malvisto § 1º do art. 2º da infeliz Lei nº 8.072, de 1990, a 6ª Turma, entre outros conceitos, tinha o de admitir a substituição das penas privativas de liberdade pelas restritivas de direitos, tal, quem sabe, desde o ano 2004, quando aqui ultimamos o julgamento do HC-32.498 – pela concessão, Medina (relator) e Naves; pela denegação, Carvalhido e Gallotti –, e foi quando votei da seguinte maneira:


"Juridicamente, é possível a substituição tal qual a defende o Relator? Ao que cuido, também penso que sim, pois, na hipótese em discussão, há de vir a pêlo a disciplina inscrita no aludido art. 44.


Ora, não são de hoje nem de ontem, mas de anteontem os apelos no sentido de que se deve, por uma série de razões de todos nós amplamente conhecidas, incentivar sejam adotadas sanções outras para os denominados delinqüentes sem periculosidade. Por exemplo, confiram-se os seguintes tópicos de três exposições de motivos: (I) 'Parece fora de dúvida que a gravidade da situação exige a imediata reformulação de alguns dispositivos legais, de modo a reservar o recolhimento a prisão para os criminosos de maior periculosidade, possibilitando aos estabelecimentos existentes dedicar-se com maior rigor àqueles cuja conduta representa mais acentuado perigo, quer para as pessoas, individualmente, quer para a sociedade, orientação que se coaduna com as recomendações de vários organismos internacionais' (Exposição de motivos da Lei nº 6.416/77); (II) 'Esse questionamento da privação da liberdade tem levado penalistas de numerosos países e a própria Organização das Nações Unidas a uma 'procura mundial' de soluções alternativas para os infratores que não ponham em risco a paz e a segurança da sociedade' (Exposição de motivos da nova Parte Geral do Cód. Penal); (III) 'O espírito que norteou a Reforma de 1984 continua presente nesta parte, principalmente quando reafirmamos que 'uma política criminal orientada no sentido de proteger a sociedade terá de restringir a pena privativa de liberdade aos casos de reconhecida necessidade, como meio eficaz de impedir a ação criminógena cada vez maior do cárcere. Esta filosofia importa obviamente na busca de sanções outras para crimes de pequena e média gravidade, se assim considerar o juiz ser medida justa. Não se trata de combater ou condenar a pena privativa da liberdade como resposta penal básica ao delito. Tal como no Brasil, a pena de prisão se encontra no âmago dos sistemas penais de todo o mundo. O que por ora se discute é a sua limitação aos casos de reconhecida necessidade' (Exposição de motivos do Projeto de Lei nº 3.473/00, que altera a Parte Geral do Cód. Penal).


Então, se razão estritamente jurídica não houvesse, mas há, sem dúvida que há, razões de política criminal igualmente existem, ótimas e suficientes razões. Nos últimos dias – e isso já aconteceu em outros momentos, inclusive através de palavras minhas –, a imprensa escrita e falada dedicou páginas e páginas, palavras e palavras ao sistema prisional brasileiro, que passa, segundo as reportagens, 'por uma crise sem precedentes'.


Confira-se, entre outras, a edição 316 da Revista Época, que constata, primeiro, que 'cerca de 30% da população prisional poderia estar cumprindo penas alternativas. A aplicação não chega, porém, a 10% dos casos, enquanto na Europa atinge 70%'; segundo, que 'a desorganização prolonga a estada de quem já podia ter saído da prisão'. Confira-se, também, o artigo de Janio de Freitas publicado na Folha de S. Paulo de 6.6.04, que afirma: 'No Brasil enraizou-se a idéia de que a cadeia é escola do crime. Será a cadeia? Ou a escola do crime é a sociedade que, por suas representações políticas e institucionais, cria e preserva condições das quais o ser humano é levado a sair como ser desumano, se ainda não o era depois das experiências precedentes?'

Já disse, mais de uma vez, mais vale o Penal preventivo que o Penal repressivo; aliás, o agravamento das penas, por si só, não constitui fator de inibição da criminalidade. Estou entre aqueles que defendem a necessidade de um direito penal humanitário.


Acompanho o Relator, também expedindo de ofício a ordem de habeas corpus."



Mas agora, lembra o Relator a lei de 2006, Lei nº 11.343, que assim dispõe no art. 44: "Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos."


2. Como disse linhas antes, desde o ano 2004, já admitíamos a substituição, e há, entre nós, principalmente no ambiente da 6ª Turma, um sem-número de julgados a propósito da substituição da pena mais gravosa. De minha parte, não terei, então, o que mais acrescentar ao que, primeiramente, escrevi para o HC-32.498, isso porque o quadro de hoje se me apresenta o mesmo quadro de ontem. Vejam que, ontem, era o já referido § 1º do art. 2º e que, hoje, é o também já referido art. 44; ora, se, a despeito de um, tal não nos impediu de ontem substituirmos uma pena por outra, o mesmo há de suceder hoje, principalmente eu penso assim, embora a lei de 2006 seja, digamos, mais enfática.



3. A lei de 2006 também alude, no art. 44, à fiança e à liberdade provisória; não obstante essa alusão, temos, na 6ª Turma, decidido da seguinte maneira (valho-me, a propósito, do HC-112.947, de 2009, de que fui relator):


"Prisão em flagrante (tráfico ilícito de drogas). Liberdade provisória (indeferimento). Fundamentação (gravidade dos fatos e vedação legal). Coação (existência). Sentença (trânsito em julgado).


1. Sendo lícito ao juiz, no caso de prisão em flagrante, conceder ao réu liberdade provisória (Cód. de Pr. Penal, art. 310, parágrafo único), o seu ato, seja ele qual for, não prescindirá de fundamentação.


2. Toda e qualquer prisão que tenha caráter de medida cautelar há de vir, sempre e sempre, efetivamente fundamentada. É o sistema – decorre das normas que informam o ordenamento jurídico brasileiro.


3. Se o indeferimento da liberdade provisória está apoiado na gravidade dos fatos, tal aspecto é insuficiente para justificar, a contento, a manutenção de medida de índole excepcional.


4. Também não é suficiente, evidentemente, a reportação, e simples, ao frio texto da lei (por exemplo, ao art. 44 da Lei nº 11.343/06), porque, se assim fosse, a prisão provisória passaria a ter caráter de prisão obrigatória, e não é esse o seu caráter.


5. Admite-se a liberdade provisória, mesmo que se trate de crime inafiançável.


6. Caso no qual o ato judicial que indeferiu a liberdade provisória carece de suficiente motivação; falta-lhe, portanto, validade, decorrendo daí ilegal coação.


7. Do mesmo modo, se à superveniente sentença penal condenatória falta persuasiva motivação, o melhor dos entendimentos é o de que a ré poderá, em liberdade, aguardar o trânsito em julgado.


8. Ordem de habeas corpus concedida."



4. Estou, portanto, sem mais nada, votando no sentido de conceder a ordem, mas, se necessário for, se for do gosto da Turma, isto é, se lícito não for, sem mais nada, a concessão da ordem, estou, então, arguindo a inconstitucionalidade não de todo o art. 44, até porque de tanto não necessito, mas da cláusula "vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos" – isso pelo fato de haver, em caso que tal, conflito com o princípio que assegura a individualização da pena (inciso XLVI do art. 5º da Constituição).



Observem o que escrevi no item 7 do voto para o HC-76.779:


"7. Tão relevante é a fundamentação, que a não-fundamentação da decisão coloca-nos diante de situação estranhíssima. Imaginemos duas condutas: uma, a de alguém expondo à venda um grama de substância entorpecente; outra, a de alguém expondo à venda (tendo em depósito, etc.) cem quilos de substância entorpecente – são condutas diferentes, é claro. É lícito ao juiz dar a ambas as condutas igual tratamento, a saber, negar a tais acusados liberdade provisória (foram presos em flagrante) sem nenhum fundamento, salvo a referência à lei pertinente? Isso me soa estranho, estranhíssimo.


Há ilustres pensamentos – estou fazendo um registro – que levam em consideração a quantidade. Porém não é o meu caso. O que eu exijo, digamos, kelsenianamente – estou sendo bem mais positivista do que jusnaturalista –, é que se trate, di-lo a lei com todas as letras e com toda seriedade, de ordem escrita e fundamentada, repito, fundamentada de autoridade judiciária competente. Estaria, pois, aplicando a lei, simplesmente; a saber, na minha compreensão, estaria simplesmente aplicando a lei."


São condutas diferentes, totalmente desiguais, e a recomendação, a melhor delas, é no sentido de que tenham soluções diferentes, se lá no caso do HC-76.779, também neste caso e principalmente nele, sob pena, aqui principalmente, de ofensa à correta individualização da pena.



Aliás, sobre sentido e limites da pena, já escrevi o seguinte (REsp-661.365, DJ de 4.4.08):


"Falemos do outro mal, a mania da criminalização, do aumento das penas privativas de liberdade, da distinção entre crimes e crimes, uns hediondos e outros não-hediondos, como se todos não o fossem – que desastrosa e infeliz distinção! –, enfim, falemos dessas manias, que muitos supõem necessárias à prevenção dos crimes. Que engano, absolutíssimo engano! Não é dessa forma que se assume posição tendente a prevenir o crime, porquanto, verbi gratia, não se previne crime algum aumentando a sua pena, digamos, a mínima de um para dois ou três anos, a máxima, de quatro para cinco ou seis anos.


Há maus momentos legislativos aqui e ali, um desses foi o da lei que dispõe sobre os denominados crimes hediondos, lei proveniente de um desses tristes momentos da dogmática penal. O meu discurso não bate com as concepções legislativas, não bate porque, respeitosamente, a lei foi um passo atrás, bem atrás, e o Direito (como ciência), mormente o Penal (a moderna dogmática), está à frente, estamos bem à frente. À pergunta a propósito do sentido da pena estatal (observem isto: quais os seus limites, qual a legitimação do poder estatal) o alemão Roxin responde dizendo que não podemos nos 'contentar com as respostas do passado, visto que a situação histórico-espiritual, constitucional e social do presente exige que se penetre intelectualmente num complexo com várias facetas'.


Dos fins imediatos da pena, a saber, o de intimidar, o de corrigir (o da reabilitação ou ressocialização) e, por que não, o de impossibilitar, temporariamente, a prática de outros crimes, filósofos e penalistas oitocentistas e novecentistas, entre os quais Beccaria (1738-1794), Carmignani (1768-1847) e Feuerbach (1775-1833), conquanto tenham liderado movimentos tendentes a humanizar o sistema penal (num momento de situações de violação, opressão e iniqüidade quanto a espécies de pena e quanto ao cumprimento), colocaram-se, entretanto, relativamente aos fins imediatos da pena, ao lado do primeiro daqueles fins, isso porque, para eles, não tinha a sanção penal outro efeito além do poder de intimidar, de coagir psicologicamente o autor do crime.


Kant (1724 - 1804) tinha a pena como imperativo categórico – exigência de justiça absoluta, retributiva, medida pelo talião ('vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé', Deuteronômio 19:21). Em seu 'Dicionário', escreveu Caygill que, (I) para Kant, a punição havia de ser 'infligida para um crime e não como um meio para algum outro fim' (por exemplo, desencorajar outros, ou reabilitar); (II) que a tese retributiva de Kant foi desenvolvida por Hegel; (III) que a tese kantiana foi recentemente eclipsada por argumentos 'que sublinham as finalidades de dissuasão e reabilitação servidas pela punição'. Entretanto, completou Caygill, a partir da década de 80, 'registrou-se um interesse renovado pelas filosofias retributivas de punição' (J. Zahar, 2000, págs. 212/213).


Todavia leia-se, ao lado de outros existentes instrumentos legislativos, a Constituição da Itália, com vigência a partir de 1948, nesta passagem do seu art. 27: 'As penas não podem comportar tratamentos contrários ao senso de humanidade e devem visar à reeducação do condenado.' De semelhante feitio, a Constituição da Espanha de 1978, art. 25, número 2: 'Las penas privativas de libertad y las medidas de seguridad estarán orientadas hacia la reeducación y reinserción social y no podrán consistir em trabajos forzados...'


Analogicamente, o Parlamento Europeu vem recomendando, a propósito da adoção de política penal e de política de execução penal, que os Estados-Membros acolham medidas relativas à reeducação do condenado, sua instrução, reabilitação e reinserção social e profissional. Vem, ainda, recomendando maior aplicação das denominadas sanções alternativas em substituição à encarceração.


Fomos aplaudidos, ainda no Império, em virtude do Código de 1830, 'obra legislativa', escreveu Aníbal Bruno, 'realmente honrosa para a cultura jurídica nacional, como expressão avançada do pensamento penalista no seu tempo'; talvez não tenhamos sido aplaudidos com o Código de 1890, mas não deixou ele, como também observou Bruno, de se apresentar 'como obra de estrutura geral avançada'. Progredimos, é claro, com o Código de 1940, entre outros pontos, com a instituição da execução da pena pelo sistema progressivo: '... de modo que a pena imposta, além do seu caráter aflitivo (ou retributivo), deve ter o fim de corrigir, de readaptar o condenado' (Exposição, nº 31).


Se se lhe nega o caráter de correção, de readaptação do condenado, a pena estatal privativa de liberdade se desfigura, deslegitima-se até, e ao Estado, então, faltariam meios que a justificassem legítima e legalmente; entre nós, por exemplo, ao que eu creio, faltam ao Estado brasileiro meios legítimos que justifiquem o discrímen relativamente ao cumprimento dessa pena, visto que, quando a lei estabelece o seu cumprimento fazendo discriminação, a essa pena se está negando o caráter de readaptação, e aí como ficam os princípios da igualdade de todos perante a lei e da individualização da pena? Princípios que conosco estão convivendo há bastante tempo (vejam que o da individualização convive conosco desde o Código de 1830).


Infelizmente, a lei sobre crimes hediondos terminou por fazer pouco caso de alguns princípios, talvez tenha mesmo o legislador procedido de caso pensado, mas, ao ver de uma plêiade de juristas, também a meu ver, tal procedimento foi de encontro a princípios benéficos que vigem desde os tempos mais remotos (igualdade de todos, individualização da pena, reabilitação, etc.). Ora, à Lei nº 8.072, de 25.7.90, só lhe faltou mesmo a criação da figura do 'abominável réu', aquela figura constante da sentença de 19.4.1792 que condenou José da Silva Xavier à forca a fim de que nela morresse (morte natural) para sempre.


De tão ilegítima, de tão ilegal, de tão insensata, de tão chocante e de tão inconstitucional que é em algumas de suas disposições, a Lei nº 8.072, quando escapa da incompatibilidade entre normas infraconstitucionais e constitucionais, é um diploma que só pode ser visto como aqueles de interpretação estrita, tal como são de interpretação estrita, na feliz lembrança de Maximiliano, 'as disposições que restringem a liberdade humana'.


Apropriada, assim e portanto, a transcrição de um trecho das 'Memórias da Casa dos Mortos', de Dostoiévski. Ei-la: 'O presídio e os trabalhos forçados não fazem mais do que fomentar o ódio, a sede de prazeres proibidos e uma terrível leviandade de espírito no presidiário. Estou convencido de que, com o famoso sistema celular, apenas se obtêm fins falsos, enganosos, aparentes. Esse sistema rouba ao homem a sua energia física, excita-lhe a alma, debilita-lha, intimida-lha, e depois apresenta-nos uma múmia moralmente seca, um meio louco, como obra da correção e do arrependimento. ‘Que espécie de correção, hem? Dostoiévski saiu do presídio em 1854, e as 'Memórias' vêm a lume em 1860; de lá para cá, é certo, presídio não mudou tanto. Essa constatação, no entanto, não nos há de desanimar, aliás, penso eu, há de levar-nos, em primeiro lugar, a pregar a sua total reforma, em segundo lugar, a reconhecer o caráter de correção da pena."



Ministro Nilson Naves

STJ - Habeas Corpus Nº 120.353 - SP (2008/0248789-7)

VOTO-VISTA

Brasília, 08/09/2009

Fonte: STJ

NA POLÍTICA DE SEGURANÇA FATAL, MULHER DE 24 ANOS MORRE E FILHA É ATINGIDA EM SEU COLO


Rio, 26 de outubro de 2009 - Uma mulher morreu baleada e sua filha, de 11 meses, foi atingida com tiro no braço esquerdo, durante uma ronda de policiais do 16º BPM (Olaria) no final da noite de domingo, na entrada da Favela Kelson`s, na Penha, Zona Norte do Rio. De acordo com parentes das vítimas, os PMs, que estariam em dois Gols e duas Blazers, entraram atirando na comunidade por volta de 23h. A bebê corre o risco de perder o braço atingido pelo tiro.

Ana Cristina Costa do Nascimento, 24 anos, que morava em Vista Alegre, em Irajá, no subúrbio, estava com a filha Caienny no colo, e se dirigia, ao lado de outra filha, de 3 anos, e do marido, com mais cinco pessoas para um ponto do ônibus na Rua Marcílio Dias, próximo à Avenida Brasil, na altura do quartel da Marinha, quando os PMs teriam feito vários disparos em direção ao grupo. A mãe da mulher soube da morte na manhã desta segunda-feira, pelo rádio.

Foto: Ernesto Carriço / Agência O Dia
Ana Cristina Costa do Nascimento, 24 anos, estava com a filha Caienny quando foi baleada Foto: Ernesto Carriço / Agência O Dia

"Caminhávamos para o ponto, quando a PM chegou dando tiros em cima da gente. Nos jogamos no chão e Ana Cristina gritou: 'socorro, acertaram o meu peito. Minha filha também está ferida'. Fizeram uma covardia. Não havia troca de tiros no local", disse D., de 17 anos, sobrinho de Ana Cristina. Segundo ele, uma das viaturas se aproximou e um policial perguntou o que tinha acontecido. "Respondi que eles tinham feito uma besteira, acertado minha tia e a filha dela. Então, eles pegaram Ana Cristina e a levaram para o hospital (Getúlio Vargas, na Penha)", contou o jovem.

Ana Cristina já teria chegado morta ao hospital, onde Caienny, conduzida por um morador, também foi internada. Durante toda a madrugada, familiares, revoltados, buscavam informações sobre a menina. Uma enfermeira informou que o disparo teria causado um "grande ferimento" no braço da criança, mas que, depois de ser operada, não corria risco de morrer. Desesperado, o pai da criança, o auxiliar de almoxarifado da empresa Medral, Anilton Aragão, 24 anos, que estava com o grupo, teve que ser sedado e levado para casa.

Policiais do 16º BPM informaram apenas que teriam sido "recebidos a tiros" por bandidos mas não teriam reagido, durante ronda na comunidade, fato negado por testemunhas. O projétil, cujo calibre não foi revelado, pegou nas costas e saiu no peito da mulher.

"Ela foi uma heroína, pois deu sua vida para salvar a filha, caindo abraçada sobre Caienny", acredita M.. Tida como uma jovem alegre e extrovertida, Ana Cristina era mãe ainda de outras duas crianças: Cauane, de 3anos, que também estava no grupo e Cauã, de 6 anos. A 22ª DP (Penha) investigará o caso. Ana Carolina tinha passado o dia na casa de uma irmã, combinando os preparativos para a festa de aniversário da filha baleada, que completará um ano no dia 19 de novembro.


Fonte: O Dia

UNIÃO DAS FACÇÕES CRIMINOSAS E A CEGUEIRA PAULISTA



Cegueira hipócrita.



São Paulo e Rio, 26 de outubro de 2009 - O Livro Comandos Vermelhos Do Brasil, de Johanes Vieira, na época em que foi publicado já alertava a quem o lesse: PCC e CV estão unidos faz tempo. O que hoje vemos é fruto da negação hipócrita das autoridades de segurança pública paulista. Cegueira de avestruz.

A disputa de facções, que na última semana provocou pelo menos 46 mortes no Rio por pontos de drogas, chegou a São Paulo. A facção criminosa fluminense Amigos dos Amigos (ADA) montou bases nas ruas e em presídios paulistas. Líderes da organização estão presos em Presidente Prudente e migraram com uma missão: tirar do Primeiro Comando da Capital (PCC) o monopólio da venda de maconha e cocaína no Estado. Os dois grupos travaram tiroteio na região Oeste, mas a polícia nega.

No Rio de Janeiro, a ADA é unida ao Terceiro Comando e, ao mesmo tempo, inimiga do Comando Vermelho (CV). Em São Paulo, o grupo é aliado ao Terceiro Comando da Capital (TCC) e rival do PCC, organização coligada ao CV. Segundo funcionários do sistema prisional paulista, na Penitenciária de Presidente Prudente, integrantes da ADA e do TCC convivem em paz há cinco meses.

Uma carta apreendida em maio deste ano no Centro de Detenção Provisória 2 (CDP) do Belém, na zona leste da capital, dominado por presos do PCC, comprova a ação do grupo fluminense em território paulista. Um trecho da correspondência escrita por um detento diz que os líderes da ADA em São Paulo são os presos Robson, Axel e Alexandre. A mensagem informa que os três batizaram os “afilhados” nos xadrezes 1, 2, 3 e 4 da ala do seguro (isolamento) da unidade.

Outro trecho diz que os líderes da ADA no CDP 2 do Belém tinham dois aparelhos de telefone celular e carregadores. Possuíam fichas de inscrição para os interessados em ingressar na facção e também cópias do estatuto do grupo. Fontes do sistema prisional contaram ao JT que a ADA mantinha, em maio, pelo menos 20 “filiados” no CDP 2 do Belém. Eles conviviam lado a lado com presos do TCC.

Nas conversas com os líderes da ADA, agentes penitenciários apuraram que parte do grupo fluminense, assim que migrou do Rio, se radicou e dominou um ponto de venda de drogas em Osasco, na Grande São Paulo. Os agentes descobriram que a principal meta da ADA é tomar, junto com o TCC, o maior número de pontos de drogas controlados pelo PCC no Estado.

Alguns meses após a apreensão da carta, presos ligados às facções ADA e TCC foram transferidos para a Penitenciária de Presidente Prudente. Na noite de 7 de agosto, integrantes da ADA e do PCC trocaram tiros no bairro Jardim Morada do Sol, naquela cidade. Cinco homens foram presos e dois adolescentes detidos. Com eles foram apreendidos sete armas, munição e um colete à prova de bala.

Os detidos foram levados à Delegacia Participativa de Presidente Prudente. Os acusados tinham passagens por tráfico de drogas, roubos, furtos e homicídios. Segundo a polícia, a guerra entre os dois grupos ocorreu pela disputa por pontos de drogas.

No último dia 17, a ADA mostrou sua “cara” e deu outra demonstração de violência em território paulista. Degmar Rufino, 43 anos, o Cigano, integrante do grupo e foragido da Penitenciária de Presidente Prudente, ateou fogo no escritório de seu advogado, em Ribeirão Preto, no interior. Motivo: o defensor não ganhou na Justiça a progressão do regime fechado ao semiaberto para Cigano.

Segundo a Delegacia de Investigações Gerais (DIG), Cigano agiu com a mulher, o filho e a nora. Armados, renderam funcionários, atearam fogo no escritório, roubaram R$ 1 mil e corrente de ouro e fugiram numa Hilux. Eles foram presos na Rodovia Anhanguera.

O Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) foi informado na semana passada sobre a existência de integrantes da ADA em presídios paulistas. Promotores de Justiça do Gaeco buscam mais informações sobre a coligação da ADA com o TCC em São Paulo.

domingo, 25 de outubro de 2009

LUIZ FERNANDO PRÔA: CARTA DE UM PAI QUE PERDEU UM FILHO PARA O CINISMO SOCIAL


Carta de um pai que perdeu um filho para a droga. Uma perda que teve início com o alcool...

"Meu filho começou na droga pelo álcool, no colégio, esta droga LEGAL com que a propaganda bombardeia nossas crianças e jovens todo dia, escancaradamente, e que produz milhares de mortes no trânsito, destrói lares, pessoas do bem e é, como se sabe, a primeira droga que os jovens experimentam. A maioria segue pela vida em maior ou menor grau se drogando com ela, o álcool, outros acabam provando das ilegais, sendo que uns fogem delas, outros se viciam numa espiral crescente e veloz. Em geral, passam pela maconha, vão na boca adquiri-la, e os comerciantes, felizes, lhes oferecem um variado cardápio, self-service: cocaína, crack, haxixe, êxtase, ácido...

Sei que há seis anos perdi meu filho para o crack, mas apesar das sequelas e problemas, ele nunca deixou de ser carinhoso e educado com todos, o que lhe granjeou um número sempre

Ele passou por várias internações - tinha, desde pequeno, outros problemas mentais que se exacerbaram com as drogas. Sempre que saia das internações ficava bem. Até encontrar os amigos, tomar umas cervejas e ai a coisa saía novamente de controle. Nestes tempos o vício, apesar de grave, ainda não tinha produzidos todos seus efeitos devastadores. Mas, com o tempo e a reincidência, o crack foi o devastando. Nos últimos tempos, dizia-se derrotado para o vício, vivia muito deprimido e voltara a frequentar o NA, Narcóticos Anônimos. Tentei de tudo para convencê-lo a se internar, mas vai pedir para um pinguço largar sua garrafa. É inútil. Ele foi cada vez mais descendo a ladeira. De mãos atadas, fiquei esperando pelo pior ou por um milagre, já que segundo os "especialistas", que ditam as políticas públicas para o tratamento de drogas, o drogado tem de se internar por vontade própria.

A reportagem que o Brasil assistiu esta semana, da mãe que construiu uma cela em casa, para tentar salvar o filho viciado em crack, é bem representativa de como as famílias vítimas deste flagelo estão abandonadas pelo Estado, e se virando à própria sorte. É bem possível que ela seja punida por isso. Na mesma reportagem, uma psicóloga inteligente afirmava que o viciado em crack tem de vir voluntariamente para tratamento. Este é o método correto, segundo a maioria dos que estão à frente das políticas para esta área. Será que essa profissional é incapaz de entender o estrago que o crack/cocaína ocasiona nas mentes de seus dependentes? Será que ela é capaz de perceber o flagelo que o comportamento desses doentes causam sobre as famílias?

Um drogado, ou adicto, que já perdeu o senso de realidade e o controle sobre sua fissura, torna-se um perigo para a sociedade, infernizando a família, partindo para roubos, prostituição e até assassinatos, por surto ou por droga. Esperar que uma pessoa com a mente destruída por droga pesada vá com seus próprios pés para uma clínica é mera ingenuidade destes profissionais. O Estado tem de intervir nesta questão para preservar as famílias e os inocentes. A internação compulsória para desintoxicação e reabilitação destes doentes, que já perderam todo o limite, é uma necessidade premente. Ou será que todas as famílias que vivem esse problema terão de construir jaulas em casa?

Se meu filho fosse filhinho de papai, como falaram, eu já teria pago uma ou mais internações. Mas infelizmente o papai aqui não tem grana para isso, assim como a maioria das famílias vítimas deste, que insisto em reafirmar, flagelo.

Hoje vi uma pessoa boa se transformar num assassino, assim como aquele pai de família correto, que um dia bebe umas redondas, dirige, atropela e mata seis num ponto de ônibus.

As drogas, ilegais ou não, estão aí nas ruas fazendo suas vítimas diárias, transformando pessoas comuns em monstros e o Estado não pode ficar fingindo que não vê.

Dizem que vão gastar 100 milhões para equipar a polícia, mas e as vítimas diretas das drogas como ficam? E os jovens humildes atraídos pelos criminosos para seu exército? E os policiais mortos em combate nesta via indireta da guerra do tráfico? Está na hora de acabar a hipocrisia!

Meu filho destruiu duas famílias, a da jovem e a dele, além de a si próprio. Queria sair do vício, mas não conseguia. Eu queria interná-lo à força e não via meios. Uma jovem, a quem ele amava, queria ajudá-lo e de anjo da guarda virou vítima.

Ele irá pagar pelo que fez, será feita justiça, isso não há dúvida. O arrependimento já o assola, desde que acordou do surto do crack deu-se conta do mal que sua loucura havia lhe levado a praticar. Ele me ligou, esperou a chegada da polícia e se entregou, não fugindo do flagrante. Não passarei a mão na cabeça dele, mas não o abandonarei. Ele cumprirá sua pena de acordo com a lei, dentro da especificidade de sua condição.

Infelizmente, só consegui interná-lo pela via torta da loucura, quando já não havia mais nada a fazer, num surto fatal.

Este é um caso de saúde pública que virou caso de polícia.

Que a família da Bárbara possa um dia perdoar nossa família por este ato imperdoável. Chorei por meu filho 6 anos atrás. Hoje minhas lágrimas vão para esta menina, que tentou por amor e amizade salvar uma alma, sem saber que lutava contra um exército que lucra com a proibição (que não minimiza o problema, pelo contrário, exacerba), por um bando de tecnocratas e suas teorias irreais, e para um Estado que, neste assunto, se mostra incompetente.

Luiz Fernando Prôa*

*Luiz Fernando Prôa é pai de Bruno de Melo, 26 anos que matou a namorada Bárbara Calazans, de 18 anos no Rio de Janeiro .

Postagens mais visitadas

Palestina e o silêncio que mata

A preocupação nunca foi com os reféns,  tampouco com o Hamass. O objetivo é o apagamento de um povo e sua cultura.  O móvel, a terra. Ao col...