quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

UPP - Contagem regressiva para pacificação no Morro do Borel

Foto Isnard Martins © 2002


UPP do Borel, na Tijuca, levará policiais a outras comunidades conflagradas

POR VANIA CUNHA


Rio, 28 de janeiro de 2010 - O Borel ainda não foi ocupado pela polícia, mas a notícia de que a comunidade vai ganhar uma Unidade de Polícia de Pacificação (UPP) — publicada ontem com exclusividade em O DIA — trouxe alívio e esperança para morro e asfalto na Tijuca. Cansados das noites sem sono e da constante ameaça de eclosão de uma nova guerra entre traficantes rivais na região, moradores, comerciantes e pessoas que frequentam o bairro comemoraram a perspectiva de pacificação, prevista para começar após o Carnaval. O Borel será a primeira comunidade da Zona Norte a receber uma UPP e, de acordo com o planejamento da cúpula da Segurança Pública, o efetivo empregado na nova unidade vai atuar no policiamento comunitário também nos vizinhos Casa Branca, Indiana e Formiga — áreas também controladas pelo tráfico.


Morro do Borel: PMs vão atuar em morros vizinhos, hoje sob domínio do tráfico. Foto: Carlo Wrede/Agência O Dia

“Quando li o jornal, abracei meus amigos do trabalho e comemorei. Não tenho como externar essa felicidade! Eu vi essa comunidade crescer, tem muita gente de bem lá e não aguentava mais ouvir tiros. Estava torcendo por uma UPP”, afirmou o funcionário público Assis Pereira, 42 anos. Ele se mudou para um apartamento perto da comunidade em 1980 e, desde então, convive com o medo. “Ficamos assustados e mudamos nossa rotina. Evito chegar em casa depois que anoitece e o prédio mantém a portaria trancada. A fachada foi atingida por tiros algumas vezes e já houve invasão de criminosos aqui. Mês passado, meus vizinhos do último andar mudaram de casa por causa da guerra”, contou.

Perto dali, outro morador já respira aliviado. O professor de Educação Física Henrique Souza, 27, contou que, desde que mudou para uma casa com ‘vista para o Borel’, há 12 anos, já recolheu mais de 30 cápsulas de diversos calibres no terraço do imóvel. “Ficamos acuados dentro de nossa própria casa, mesmo fora do morro. Meu carro foi roubado por bandidos de lá, que fugiam da polícia. Vamos pedir socorro a quem? Já não via a hora de olharem pela situação da Tijuca, que é grave e urgente. Essa violência só vai terminar quando a polícia tomar as rédeas”, torce Henrique. Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram que o desabafo do morador da Tijuca tem fundamento: de janeiro a novembro de 2009, criminosos roubaram cerca de três veículos por dia na região.

A ocupação do Borel poderá libertar os mais de 2 mil moradores da comunidade do terror que o tráfico impôs nos últimos anos. No fim do ano passado, a guerra entre as quadrilhas do Borel, Formiga e Casa Branca durou dois meses e deixou dezenas de mortos e feridos. Além dos tiroteios violentos, os bandidos são apontados pela polícia como alguns dos responsáveis por roubos e homicídios ocorridos na região. Segundo investigadores, cerca de 60% dos crimes ocorridos na área eram praticados por jovens criminosos recrutados pela quadrilha. Os principais chefes do tráfico no morro estão presos.

A primeira parte da ocupação acontece com a entrada de homens do Batalhão de Operações Especiais (Bope). A fase inicial não tem data para terminar e inclui a apreensão de armas e drogas, além da captura de criminosos. Depois da entrada da polícia, começa a fase de instalação da UPP. Como nas outras seis unidades já em funcionamento, o policiamento ficará a cargo de militares recém-formados. A próxima turma, com 391 recrutas, ficará pronta para ir às ruas em abril. Parte deste efetivo será destinado à nova UPP.

Ontem, o assunto nas ruas da Tijuca era a ocupação do Borel. O tema virou debate até entre taxistas, em um ponto próximo à comunidade. “Só vou acreditar quando acontecer. Vejo as notícias de outros lugares, mas ainda não vivi essa realidade”, disse um motorista. “Hoje, nós temos que escolher se levamos ou não passageiro para o morro porque ninguém quer arriscar a vida. Se soubesse que aqui teria UPP, não teria mudado. Vendi minha casa por metade do valor e saí daqui porque não aguentava mais tanta violência. Parece que agora temos esperança”, contou outro taxista.

Morador quer voltar a ‘passar pelo Alto’

Protegido apenas por parte da fachada de um edifício vizinho, Assis Ferreira agradece por nunca ter tido sua casa atravessada por um tiro. A casa de um vizinho, no entanto, não teve a mesma sorte. “É angustiante ouvir os tiros e não saber o que pode acontecer. Agora poderemos ter a liberdade de voltar a sair, passar pelo Alto da Boa Vista, caminho que evito há meses, desde que eu e minha mulher fomos assaltados por bandidos que fugiam dali”, acredita.

Moradora do bairro há 20 anos, a professora Amanda Alexandre, 37, também acredita na pacificação do Borel como possível solução para reduzir a criminalidade na Tijuca. “É uma área cercada por morros, que vivem em guerra. A gente ouve tiroteios, sabe de casos de violência que acontecem muito perto e fica assustado. Não nos sentimos seguros aqui. Acho uma ótima solução essa unidade de pacificação e dou um voto de confiança. Mas quero ver a realidade mudar para acreditar”, conclui.

Arte O Dia
Fonte O Dia

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